domingo, 6 de novembro de 2016

                                  MARTA E MARIA
A história sobejamente conhecida, protagoniza­da ao lado de Jesus por Marta e Maria, irmãs de Lázaro, se cotejada com a história das outras discípulas, mostra uma faceta diferente em dois sentidos. Primeiro, pela ên­fase que os Evangelhos dão às demonstrações de apreço e amizade do Senhor por essa família. Eles eram amigos íntimos e, ao ver Maria e os judeus chorarem a morte de Lázaro - o texto joanino registra – Jesus chorou. (João 11.35). Segundo, porque as irmãs não participavam do ministério itinerante do Mestre, conforme acontecia com a maioria das outras discípulas. Nenhum dos evangelistas registra a presença delas entre os que acompanhavam o Senhor em Suas jornadas. A história desenrolou-se pelo caminho inverso. Foi Jesus quem as encontrou, e passou a abençoá-las ensinando-lhes a Palavra: E aconteceu que, indo eles (Jesus e Seus discípulos) de caminho, entrou numa aldeia; e certa mulher, por nome Marta, o recebeu em sua casa; e tinha esta uma irmã chamada Maria, a qual, assentando-se também aos pés de Jesus, ouvia a sua palavra (Lucas 10. 38,39).
Dois importantes ensinamentos destacam-se no texto. Primeiramente, a revelação do que significa "rece­ber a Jesus e ouvi-lO." Atitude transformadora, verdadei­ra metamorfose, pela qual a pessoa é alçada à condição de discípulo de Cristo. Foi justamente, o que sucedeu às duas irmãs, Marta recebeu-O em sua casa e Maria ouviu o Mestre. Pela pertinência, recorremos ao texto de Apo­calipse 3.20, no qual se lê: Eis que estou à porta, e bato:  se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo. Palavra que se cumpriu de maneira esplendorosa na vida dessas mu­lheres, cujo coração respondeu ao chamado do Salvador.
Observemos a outra lição que se pode extrair do episódio:
No que concerne a Maria, a anotação de maior consistência teológica é aquela de estar “sentada aos pés do Senhor” para ouvir a Sua palavra. Se para o leitor mo­derno não informado se trata somente da observação de uma afetuosa e devota atitude de escuta, num contexto da cultura judaica é algo mais. “Sentar aos pés de” em Israel era uma expressão quase técnica para indicar a situação discipular. Tornar-se discípulo de um mestre a fim de ser por ele bem instruído na Lei era vivamente recomenda­do a todo judeu homem, mas era quase que inconcebível para uma mulher.
Novamente, em gritante contraste com o costume judaico de ignorar as mulheres, negando-lhes o direito ao conhecimento das Escrituras, o Mestre aparece mi­nistrando a palavra a uma mulher. Observe-se que o vo­cábulo discípula nem sequer existia em hebraico, idioma no qual a palavra discípulo não tinha o gênero feminino. A condição das mulheres, em geral, sofreu uma trans­formação radical operada pelo Senhor, em todos os seus níveis. Na realidade, como se um universo tivesse sido edificado especialmente para acolher o gênero feminino, em relação ao pouco espaço que lhe fora permitido ocu­par na sociedade antiga. Jesus revolucionando, concomi­tantemente, edificava.
Marta, vítima de injustiça histórica: Enquanto Ma­ria encontrava-se aos pés de Jesus, atenta à Sua palavra, conforme relata o texto de Lucas 10, Marta andava dis­traída em muitos serviços e, aproximando-se, disse: Se­nhor, não se te dá de que minha irmã me deixe servir só? Dize-lhe pois que me ajude. (v.40). Ao que Jesus lhe respondeu: Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas. Mas uma só é necessária; e Maria esco­lheu a boa parte, a qual não lhe será tirada. (vv. 41b, 42). Historicamente, as palavras de Jesus têm sido interpreta­das como sendo de repreensão à Marta, e o episódio visto como significativo da vida ativa em contraste com a vida contemplativa. Isso, além de restringir a riqueza do significado do episódio, tem determinado um notável e injusto amesquinha­mento da figura de Marta, sobre a qual, a reflexão está voltan­do hoje com resultado de notável interesse.
Em favor de Marta devemos evocar suas palavras de caráter profético, quando demonstrou reconhecer a messianidade de Jesus, ao afirmar ser Ele o Cristo. (João 11.27). Além de tê-lO recebido em sua casa – e em seu coração - Marta deu mostras de que, também, havia aprendido as Suas lições e conhecia a Palavra. Podemos avaliar seus conhecimentos, não só pela palavra profética que proferiu sobre o Salvador, mas, também, pela respos­ta que disse, ao Senhor, por ocasião da morte de Lázaro. No momento em que Jesus garantiu-lhe que Lázaro res­suscitaria, Marta replicou: Eu sei que há de ressuscitar na ressurreição do último dia (v.24b). Desta vez, porém, Jesus referia-Se ao milagre que estava prestes a realizar, ao trazer Lázaro de volta à vida. Esse poder de Jesus, que acabara de Se auto definir como sendo a ressurreição e a vida, (v.25), Marta viria a conhecer de imediato.

Maria de Betânia, vale lembrar, foi a mulher que un­giu Jesus com perfume de altíssimo valor, poucos dias antes de Sua morte, conforme relato do livro de João (12.1-11); assunto já abordado no capítulo A Revolução do Amor. Para a realização desse ato, concorreram, certamente, o presságio a respeito da morte próxima de Jesus aliado ao sentimento de gratidão devida a Ele, pelas inúmeras e grandiosas bênçãos derramadas sobre toda a família.

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