sábado, 26 de novembro de 2016

           MARIA MADALENA, APÓSTOLA DOS APÓSTOLOS

Impressiona a tendência humana de se decidir pelo mal. A fama de Maria Madalena, como pecadora – pros­tituta - é uma mostra exemplar da propensão. Não há, no Novo Testamento, uma palavra sequer que a classifique como tal; o que se sabe é que Jesus expulsou dela sete demônios. Na narrativa de Lucas (8.2), ela aparece inclu­ída entre algumas mulheres que haviam sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades.
Lillia Sebastiani, estudiosa dos textos evangélicos, acredita que se tratava de misteriosos sofrimentos psicos­somaticos. E, em seguida, propõe: Seja qual for a forma de encarar o problema, se deve sempre identificar uma anomalia. Ao que, acrescentamos e sublinhamos não se tratar, necessariamente, de pecados tais como faltas de natureza sexual como a prostituição. A autora conclui: O seu encontro com Jesus marca a realização da harmonia interior e da plenitude pessoal.
A fama de “Madalena arrependida”, invenção hu­mana, atravessou os séculos. Até hoje o seu nome traz à lembrança - dos menos avisados - a figura da mulher pecadora, sobrepondo-se à da mulher liberta e santifi­cada por Cristo. A mulher que teve a suprema graça de ser a primeira a avistar o Ressuscitado, ficou em segundo plano; sua memória permanece à sombra da pecadora, massacrada, ignorada e suplantada pelo famigerado con­ceito que lhe fora imputado.
A mulher, digna de ouvir a voz do Salvador, na­quele domingo de Páscoa, dizendo-lhe: Eu vos saúdo! (Mateus 28.9), e de ser encarregada por Ele de levar a mensagem da ressurreição, foi ofuscada na história cristã por uma calúnia. Ignorada por sua santidade, costuma ser lembrada por uma ignomínia que se apegou ao seu nome. Como se o inconsciente coletivo se tivesse embo­tado diante do acontecido no domingo da ressurreição. As pessoas, tudo indica, tiveram dificuldade para assi­milar o milagre representado pela metamorfose experi­mentada por Madalena: de vítima de opressão satânica, redimida por Cristo e elevada ao papel de deuteragonista da ressurreição (João 20. 1-18), ou seja, aquela que ocu­pou o segundo lugar na cena da ressurreição.
Não posso deixar de abrir um parenteses, aqui, a fim de admirar a tremenda lição que se pode extrair des­sa demonstração do poder transformador de Deus; do milagre dos milagres, que é a operação do poder divino para transformar vidas, anunciado por Cristo: O Senhor [...] enviou-me a curar os quebrantados do coração.
A apregoar liberdade aos cativos, e dar vista aos ce­gos; a pôr em liberdade os oprimidos; a anunciar o ano aceitável do Senhor. (Lucas 4.18.19).
Em Maria Madalena cumpriu-se exemplarmente essa palavra. Ela viu-se, sob a maravilhosa graça de Cris­to, liberta de seu cativeiro e de seus opressores espirituais, para viver a experiência que, no domingo de Páscoa, a le­vou a exclamar: Vi o Senhor! e cumprir o seu mandado a fim de avisar aos apóstolos que o Senhor está redivivo e que poderiam encontrá-lO na Galiléia.
"Apóstola dos apóstolos”, assim ela é chamada por Bernardo de Claraval, erudito cristão, em seu Sermones in Cantica.Título extensivo, também, às outras mulhe­res, que a acompanharam na missão de proclamar o que­rigma da Páscoa, denominadas então de apóstolas dos apóstolos. (Continua).

domingo, 13 de novembro de 2016

TEXTO EXTRAÍDO DO LIVRO MENSAGEIRAS DA RESSURREIÇÃO

                           A PROIBIÇÃO DE ENSINAR
A interpretação equivocada das palavras de Paulo, registradas em 1 Timóteo 2.11-13, no sentido de proi­bir a mulher de ensinar na Igreja, tem impedido a sua caminhada em direção ao púlpito, segundo a teoria dos igualitários. A carta paulina exorta: A mulher aprenda em silêncio com toda a sujeição. Não permito, porém, que a mulher ensine, nem use de autoridade sobre o ma­rido, mas que esteja em silêncio. Porque primeiro foi for­mado Adão, depois Eva. Como devem ser interpretadas tais palavras?
A explicação dos eruditos sobre os versículos 11 e 12, e bem explanada por Stanley Grenz, faz menção à luta da Igreja contra os falsos mestres e à propagação de heresias no meio cristão, entre os efésios:
As mulheres de Éfeso eram suscetíveis ao engano dos falsos mestres e ao envolvimento na propagação de crenças heréticas. Assim sendo, o apóstolo ordenou a es­sas mulheres que se abstivessem de ensinar e aprendes­sem respeitosamente com os verdadeiros professores.
Essa ordem, bem como a outra dirigida às mulheres da cidade de Corinto, para que evitassem falar na Igreja, seria uma proibição temporária porque dirigida a um grupo específico de mulheres. Ironicamente, ao comba­ter doutrinas heréticas, o apóstolo tornou-se ele próprio vítima - não de crenças heréticas - mas, de interpretações falaciosas, que vieram a repercutir sobre a sua memória, fazendo seu nome passar à História associado ao machis­mo e à misoginia.
Estudiosos apontam uma contradição na interpre­tação daquelas palavras do texto de Efésios, causadoras de milenares polêmicas, contrapostas à maneira como Paulo aceita e enaltece o trabalho das mulheres cristãs. O texto de Romanos 16 é, especialmente, apontado como prova dessa realidade favorável às mulheres, no qual o apóstolo dá mostras de reconhecer a autoridade de mui­tas delas na propagação do Evangelho. (Romanos 16.7). Basta observarmos alguns dados bíblicos sobre o assunto, tais como o fato de Paulo ter aceitado trabalhar ao lado das mulheres cristãs, sem discriminá-las, antes, enalte­cendo efusivamente o trabalho que realizavam na obra missionária, isto é, a proclamação da Palavra e ensino com autoridade. O relato de Atos 18.26, dá um exemplo inconteste a esse respeito, ao mostrar Priscila, ao lado do marido, Áquila, instruindo Apolo. Sobre o mestrado de Priscila falaremos mais adiante no capítulo de Atos das Apóstolas.
Febe, Lídia e tantas outras conforme relata o Novo Testamento, foram dignas de sua confiança a ponto de o apóstolo deixar em suas mãos a direção de igrejas funda­das por ele. Com grande insistência, Paulo pedia à Igreja que o acompanhasse no reconhecimento às discípulas (Romanos 16) pelo trabalho inestimável que realizavam.
Ele trabalhava lado a lado com elas – tal como ao lado dos discípulos - aceitando, inclusive, e de bom grado, que o ajudassem no custeio de suas viagens missionárias. Foi, também, na casa delas que muitas vezes abrigou-se ao sair da prisão, pois, à época, os cristãos sofriam inten­sa perseguição. Ser prisioneiro, era quase uma rotina na vida do apóstolo, tanto que Paulo se intitula, em algumas de suas cartas, prisioneiro de Jesus Cristo (Efésios 3.1; 2 Timóteo 1.8; Filemom 1. 1,9). Em meio às suas tribula­ções, o apoio feminino não lhe faltou.
Como suas cooperadoras, será que as discípulas es­tavam impedidas de ensinar?
Pelo visto, segundo evidências, a mulher exercia, sim, o mestrado, fato acatado por teólogos igualitários que interpretam a proibição de Paulo como sendo de caráter temporário, destinada a resolver problemas mo­mentâneos enfrentados pela igreja de Éfeso. Urgia livrar a congregação da influência nefasta das crenças heréti­cas, as quais estavam sendo disseminadas por aquele gru­po de mulheres suscetíveis ao engano dos falsos mestres. O apóstolo as exorta, então, a ouvir os seus maridos, certamente cristãos, e não darem mais ouvidos aos falsos mestres. Assim entendido, o texto de 1 Timóteo não entra em contradição com o de Romanos 16. Sua interpretação superficial e falacio­sa sim, é a responsável pela polêmica que, até os dias atuais, repercutem de maneira negativa na Igreja, impedindo a mulher de exercer os seus direitos cristãos.
Vêm contribuir, ainda, para elucidar a questão ou­tras opiniões abalizadas de teólogos:
As mulheres devem ser calmas, controladas, res­peitando e confirmando seus professores, em vez de exer­cerem autoridade autocrática que destrói suas vítimas. Paulo não está aqui proibindo as mulheres de pregar, orar e de exercer uma autoridade edificante, nem de pastorear. Está simplesmente proibindo que elas ensinem ou usem sua autoridade de maneira destrutiva. (Continua).


domingo, 6 de novembro de 2016

                                  MARTA E MARIA
A história sobejamente conhecida, protagoniza­da ao lado de Jesus por Marta e Maria, irmãs de Lázaro, se cotejada com a história das outras discípulas, mostra uma faceta diferente em dois sentidos. Primeiro, pela ên­fase que os Evangelhos dão às demonstrações de apreço e amizade do Senhor por essa família. Eles eram amigos íntimos e, ao ver Maria e os judeus chorarem a morte de Lázaro - o texto joanino registra – Jesus chorou. (João 11.35). Segundo, porque as irmãs não participavam do ministério itinerante do Mestre, conforme acontecia com a maioria das outras discípulas. Nenhum dos evangelistas registra a presença delas entre os que acompanhavam o Senhor em Suas jornadas. A história desenrolou-se pelo caminho inverso. Foi Jesus quem as encontrou, e passou a abençoá-las ensinando-lhes a Palavra: E aconteceu que, indo eles (Jesus e Seus discípulos) de caminho, entrou numa aldeia; e certa mulher, por nome Marta, o recebeu em sua casa; e tinha esta uma irmã chamada Maria, a qual, assentando-se também aos pés de Jesus, ouvia a sua palavra (Lucas 10. 38,39).
Dois importantes ensinamentos destacam-se no texto. Primeiramente, a revelação do que significa "rece­ber a Jesus e ouvi-lO." Atitude transformadora, verdadei­ra metamorfose, pela qual a pessoa é alçada à condição de discípulo de Cristo. Foi justamente, o que sucedeu às duas irmãs, Marta recebeu-O em sua casa e Maria ouviu o Mestre. Pela pertinência, recorremos ao texto de Apo­calipse 3.20, no qual se lê: Eis que estou à porta, e bato:  se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo. Palavra que se cumpriu de maneira esplendorosa na vida dessas mu­lheres, cujo coração respondeu ao chamado do Salvador.
Observemos a outra lição que se pode extrair do episódio:
No que concerne a Maria, a anotação de maior consistência teológica é aquela de estar “sentada aos pés do Senhor” para ouvir a Sua palavra. Se para o leitor mo­derno não informado se trata somente da observação de uma afetuosa e devota atitude de escuta, num contexto da cultura judaica é algo mais. “Sentar aos pés de” em Israel era uma expressão quase técnica para indicar a situação discipular. Tornar-se discípulo de um mestre a fim de ser por ele bem instruído na Lei era vivamente recomenda­do a todo judeu homem, mas era quase que inconcebível para uma mulher.
Novamente, em gritante contraste com o costume judaico de ignorar as mulheres, negando-lhes o direito ao conhecimento das Escrituras, o Mestre aparece mi­nistrando a palavra a uma mulher. Observe-se que o vo­cábulo discípula nem sequer existia em hebraico, idioma no qual a palavra discípulo não tinha o gênero feminino. A condição das mulheres, em geral, sofreu uma trans­formação radical operada pelo Senhor, em todos os seus níveis. Na realidade, como se um universo tivesse sido edificado especialmente para acolher o gênero feminino, em relação ao pouco espaço que lhe fora permitido ocu­par na sociedade antiga. Jesus revolucionando, concomi­tantemente, edificava.
Marta, vítima de injustiça histórica: Enquanto Ma­ria encontrava-se aos pés de Jesus, atenta à Sua palavra, conforme relata o texto de Lucas 10, Marta andava dis­traída em muitos serviços e, aproximando-se, disse: Se­nhor, não se te dá de que minha irmã me deixe servir só? Dize-lhe pois que me ajude. (v.40). Ao que Jesus lhe respondeu: Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas. Mas uma só é necessária; e Maria esco­lheu a boa parte, a qual não lhe será tirada. (vv. 41b, 42). Historicamente, as palavras de Jesus têm sido interpreta­das como sendo de repreensão à Marta, e o episódio visto como significativo da vida ativa em contraste com a vida contemplativa. Isso, além de restringir a riqueza do significado do episódio, tem determinado um notável e injusto amesquinha­mento da figura de Marta, sobre a qual, a reflexão está voltan­do hoje com resultado de notável interesse.
Em favor de Marta devemos evocar suas palavras de caráter profético, quando demonstrou reconhecer a messianidade de Jesus, ao afirmar ser Ele o Cristo. (João 11.27). Além de tê-lO recebido em sua casa – e em seu coração - Marta deu mostras de que, também, havia aprendido as Suas lições e conhecia a Palavra. Podemos avaliar seus conhecimentos, não só pela palavra profética que proferiu sobre o Salvador, mas, também, pela respos­ta que disse, ao Senhor, por ocasião da morte de Lázaro. No momento em que Jesus garantiu-lhe que Lázaro res­suscitaria, Marta replicou: Eu sei que há de ressuscitar na ressurreição do último dia (v.24b). Desta vez, porém, Jesus referia-Se ao milagre que estava prestes a realizar, ao trazer Lázaro de volta à vida. Esse poder de Jesus, que acabara de Se auto definir como sendo a ressurreição e a vida, (v.25), Marta viria a conhecer de imediato.

Maria de Betânia, vale lembrar, foi a mulher que un­giu Jesus com perfume de altíssimo valor, poucos dias antes de Sua morte, conforme relato do livro de João (12.1-11); assunto já abordado no capítulo A Revolução do Amor. Para a realização desse ato, concorreram, certamente, o presságio a respeito da morte próxima de Jesus aliado ao sentimento de gratidão devida a Ele, pelas inúmeras e grandiosas bênçãos derramadas sobre toda a família.